Faz
tempo. Tempo em que algumas pessoas deslocavam-se de Caxias do Sul para
Farroupilha e vice-versa, pessoas que aqui trabalhavam na indústria ou comércio,
ou como professor, sempre utilizando ônibus da empresa Ozelame, realizando aquele
percurso usual. Entre tantos horários havia um, especificamente, 18hs 20min..Pela
assiduidade daquele horário um grupo foi formado, aproximadamente entre seis
passageiros... eu junto. Percorrendo o
itinerário habitual, em torno de 40 minutos, tempo suficiente para se fazer
amizade, jogar conversa fora, contar fatos corriqueiros decorridos durante o
dia, principalmente aqueles espirituosos, engraçados. Assim o tempo passava
rápido, num trajeto enfadonho, coletivo lotado, sem conforto e ainda a apoquentar
o aborrecido pinga-pinga. Nas sextas-feiras o ambiente era bem mais animado, a turma
se esbaldava na euforia, afinal, sábado e domingo em casa. Hoje em dia se diria
“sextou”. Vida que segue, a fila que anda, não se sabe para onde, talvez para
um lugar incerto e desconhecido. Na segunda-feira tivemos conhecimento de um
trágico desfecho da vida. Entre aquela turma conheci Ivana – jamais esqueci seu
nome pelo trágico destino – moça simples, de fácil relacionamento,
comunicativa, com tendência instintiva pela empatia, a inclinação plena para o
sorriso, a felicidade aberta em claros olhos, a vontade intensa de viver,
certamente com uma infinidade de propósitos, projetos, esperança de um auspicioso
futuro. Não chegou ao futuro, o presente terminou, tudo ficou num horrendo
passado. As aspirações de Ivana abruptamente foram encerradas, o palco de sua
vida desmanchou-se, encerrou-se, as cortinas fecharam-se, decididamente tudo
acabado. A peça do teatro de sua vida acabou típica das tragédias gregas, forma
trágica, horripilante, dantesca, uma vida horrivelmente findada. Ivana assassinada,
seviciada, estuprada, truculência escancarada. Não merecia aquela atrocidade,
ninguém. Foi um ato animalesco, protagonizado pela irracionalidade, por um, ou
mais psicopatas, tresloucados, ato de aterradora bestialidade. Quem conviveu
com Ivana, até desconhecidos, fica entorpecido num sentimento de revolta, de
repulsa.
Vítima
de cruel crime, o corpo de Ivana foi literalmente dilacerado, há quem afirme
algo nunca visto como registro de necropsia no (IML). Um cadáver despedaçado, trucidado,
um corpo inerte mutilado por furiosa raiva. A vida de Ivana não seguiu, ficou
parada, foi para um lugar certo, mas ainda desconhecido. Pela decomposição do corpo,
pelas machucaduras no rosto, o velório foi em esquife fechado. Melhor assim ao
invés de dilacerante momento com o ataúde aberto. O último instante, a
derradeira despedida foi negada aos parentes e amigos. Na lembrança fica somente
o profundo olhar num rosto jovial, vivaz, de beleza para a vida que a esperava.
Morte cruel chegou antes. Violenta abjeção, uma monstruosidade praticada por um
alguém ou, por outros alguéns. Vida interrompida, vítima da crueldade, o desenlace
inesperado e precoce, a breve interrupção definitiva da vida. Ivana, vida que
se foi, que causou dor cruente para todos nós.
Continuamos
a usar o ônibus das 18hs 20 min. Sem mais aquela alegria, a afetuosidade
inerente. O coletivo parecia andar mais devagar. Ao invés de 40 minutos, o
trajeto parecia ser de 60. Não chegava nunca. Não mais importava o desconforto,
muito menos o incessante pinga-pinga. Ambiente de melancolia. Faltava alguém
naquele ônibus, faltava Ivana.
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