quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Feliz Ano Novo

Cumprimento usual na virada de cada ano entre as pessoas: Feliz Ano Novo. Afora isso, essa costumeira saudação, esse período de tempo, me faz lembrar o conto do Rubem Fonseca, intitulado Feliz Ano Novo contido no livro de contos com mesmo título. Trata-se de um mordaz e realista texto do renomado autor, expondo cruelmente o contraste entre a classe marginalizada, os excluídos socialmente e a burguesia abastada e indiferente, cínica e hipócrita, ao que acontece nos recônditos, onde infesta a vida de indigentes, a sobrevivência de pobres miseráveis. Retrata com fidelidade as desigualdades históricas, revela com aspecto feio e repugnante as distorções e diferenças sociais. Narrado na primeira pessoa, do ponto de vista de um personagem que observa aos movimentos e preparativos para a chegada do Ano Novo, a propaganda intensa para a compra de presentes, roupas de luxo para as grã-finas, as elites saboreando comida e bebida importadas. Já se sabe desde a primeira linha de que, do estrato social, são retirados os protagonistas dessa história. No texto acumula-se o necessário para localizá-los em sua miséria: estão em lugar que cheira mal, entre drogas, bebidas e objetos roubados. São negros, feios, desdentados e analfabetos, ensina o narrador, que é um deles, companheiro de outros dois, Pereba e Zequinha.
O trio decide a realizar um roubo. Escolhe uma mansão onde os bacanas realizam uma sofisticada festa de réveillon. A residência é invadida. Os marginais ficam deslumbrados com o luxo da casa e a comparação é inevitável com o chiqueiro em vivem. Entre outros compartimentos, se deparam com o requinte do banheiro de grande banheira de mármore, num ambiente todo espelhado. Depois de olharem o esplendoroso banheiro, um deles resolve defecar sobre a rica colcha de cetim sobre a cama em um dos quartos, numa demonstração de ter seu significado vinculado ao pretenso desprezo do bandido pelo luxo presenciado. Trata-se de uma vingança social, moral, seja lá o que for. A vida para as pessoas assaltadas começa a valer muito pouco, sucumbidas diante da violência. O título Feliz Ano Novo – somente o título - conduz o leitor a uma falsa interpretação. Porém no decorrer da leitura do conto encontra-se outra realidade, dura e cruel, e outra versão para o título. Isso provoca um choque, pois há um grande contraste, uma profunda ironia, onde o título reflete apenas a alegria dos bandidos.
Depois de assassinatos, estupros e roubos de dinheiro e jóias na residência visada, os bandidos saboreiam comida e bebida também roubadas no indigente lugar onde sobrevivem, desejando entre eles Feliz Ano Novo.

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