quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Com um voto se ganha...ou se perde uma eleição

Disputa eleitoral acirrada é conhecida propriamente por voto a voto. Faz sentido aquela afirmação de que todo voto faz diferença. Pode se tratar como força de expressão para ilustrar o quanto pode ser uma disputa eleitoral.
Roda de chimarrão. Um grupo de gaúchos reunidos, na verdade caseirenses, gentílico de quem nasce em Caseiros - município de um pouco mais de três mil habitantes -, lá para as bandas de Passo Fundo, saboreia o mate naquela manhã de domingo de eleição. Como não poderia ser diferente, a gauchada está proseando sobre o pleito local. Enquanto a cuia passa de mão em mão em certas ocasiões a prosa se torna uma charla. Em certo momento a conversa á toa deixa de ser monótona por uma decisão radical. Alguém na roda desperta a atenção quando de vereda afirma: - “Não irei votar. Com mais de 70 anos não tenho mais obrigação, além de que o meu macanudo candidato já venceu a corrida, então não vai nem precisar do meu voto”.
A conversa fica animada, vira discussão. Parte do grupo classifica o voto como dever do cidadão não importando a idade, claro, desde que ele tenha a condição saudável para votar. Outra parte tem a opinião de que o eleitor pode ter a atitude de não votar, o que a lei lhe faculta. Pareceres discutidos sem haver consenso.
Outro alguém do grupo se manifesta. Está amparado em muletas devido a fratura em uma das pernas. Diz que irá votar, embora com imensa dificuldade em se locomover. Afirma que nada está ganho e o seu candidato não pode perder seu voto.
Final de tarde, fim da eleição. Apuração. O candidato do eleitor da perna fraturada somou 1.246 sufrágios e se elegeu prefeito. O candidato do septuagenário somou 1.245, infelizmente como se nota perdeu por 1 voto. Seria o voto perdido do eleitor beneficiado pela lei eleitoral?
                                                                      *** ***
No município de Pescaria Brava, sul do litoral de catarinense, vizinho a cidade de Laguna, população de um pouco mais de 10 mil habitantes, o candidato Deyvison (PMDB) somou 2.751 votos (41%), Honorato (PSDB) 2.750 (40,99%), Marciano (PSD) 1.208 (18.01%). Deyvison como se observa elegeu-se prefeito por 1 voto e fez tudo para isso:- “Três eleitores acamados que não teriam condição de irem votar devido a doença, foram levados pelos filhos e votaram em nossa chapa”. Três doentes que devem ter decidido uma eleição.
                                                                      *** ***
No município de Cariús, no sul do Ceará, com uma população de mais de 18 mil habitantes, a apuração apresentou como resultado o empate em votos, fato que já ocorreu em outras eleições, mas que desta feita em 2016, foi o único.
A eleição por lá não foi decidida por um eleitor com mais de 70 anos que não compareceu para votar, ou aquele da perna fraturada que se esforçou em votar ou os três doentes votantes e por outros mais motivos. Em Cariús o que decidiu foi a certidão de nascimento. As urnas apresentaram como resultado empate: o candidato 

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Macho gaúcho: fincou o braço na mulher

Dia 20 de setembro. Para saber das festividades gaúchas removo o dial do rádio. De repente numa emissora desperta meus ouvidos atentos a execução de uma música gauchesca cuja letra é uma afronta as mulheres, uma alusão a violência:
“Rasguei a certidão de casamento / Finquei o braço na mulher / Foi um gritedo / Vesti uma elegante fatiota / Despachei duas amantes / E me mandei pro chinaredo/.
Programa ao vivo. De imediato em nome de uma organização de defesa dos direitos das mulheres, uma senhora reclama indignada, disse não se tratar de censura, mas um protesto pelo profundo mau gosto em executarem aquele tipo de música.
Mais do que nunca a lei Maria da Penha devia ser executada, ao menos investigar o autor desse atentado musical contra a mulher.




     

Estupro...a mulher é culpada?

Banco na praça. Ali sentadas estão duas senhoras, ambas sexagenárias, assim são idosas, talvez mais ofensivamente velhas, ou de forma mais amena “a melhor idade”, de maneira aliviante “a terceira idade”.
Eufrásia e Clotilde, assim chamadas as duas senhora, numa tarde de sol brilhante primaveril, estão protegidas pela sombra de um imponente e exuberante ipê, desabrochando flores de tom amarelo vivo, lindamente douradas.
Eufrásia e Clotilde, tranquilas desfrutam a natureza. Jogam conversa fora, normalmente falando de quem está doente ou de alguma novela da Globo.
A conversação num relance é interrompida.
Uma linda moça, também com a proteção do frondoso ipê, caminha com aquela manifestação alegre de um sorriso nos lábios. O andar com jeito malemolente, mexendo com os quadris, sem saracoteio exagerado, cheia de graça, passa em frente duas conversadeiras. Diz Eufrásia para Clotilde: - “Olha só, olha o vestido daquela moça. Que sem-vergonhice, saia curtinha”.
Clotilde concorda: - “É demais, é uma indecência. Reparou o decote, quase lá no umbigo. Depois reclama de que é estuprada”.
As duas mais uma vez concordam. Estão em comum acordo quanto ao fato trata-se de uma provocação com aquela vestimenta, sujeita e culpada por um possível estupro.
                                                                          *** ***
A jovem nada ouve e se ouvisse em nada influenciaria em seu comportamento.
Lulu é assim conhecida. Linda, exuberante, segue soberana, divina rainha.
Adiante encontra a amiga Lili. Lulu além da saia curta, do decote, usa blusa de um ombro só, que permite denotar a bela parte lateral, a perfeita proporção harmônica da região escapular.  Lili de supetão, surpreendida, logo depois dos famosos três beijinhos como cumprimentos:- “Que roupa ousada Lulu. Não tem medo de ser estuprada?”
Lulu fica indignada e  convincente solta o verbo como resposta:- “Eu quero liberdade total, até mesmo no meu jeito de vestir. Não vou me censurar, me apavorar, ficar tolhida em minhas vontades por causa de machismo, dos tarados”.
Lili, com roupagem bem discreta, sem mostrar seus belos atributos físicos, diz:
- “Queria ter sua coragem Lulu, mas tenho muito medo de ser estuprada”
                                                                         ***  ***
Pesquisa encomendada à Datafolha pelo Forum Brasileiro de Segurança Pública, apura  que um, em cada três brasileiros, acham que a mulher tem culpa pelo estupro, por provocação pelo uso de roupas ousadas.
Entre homens e mulheres um terço afirma que mulheres que usam roupas indecorosas é um desafio, tentação ao animalis macho. Essas mulheres provocativas não podem reclamar de uma possível violência, de uma estupração.
30% das pessoas entrevistadas possuem aquela opinião, sendo 42% dos homens e o mais incrível e desalentador 32% das mulheres, a maioria com mais de 60 anos, tipicamente de forma radical conservadoras, como Eufrásia e Clotilde.

                                                                          *** ***

A eleição que não houve...houve sim, vencida por 1 voto

Temporada de eleição municipal. Estimulado pela curiosidade busco conhecimentos relativos às outras eleições farroupilhenses. Na verdade muitas eleições que deveriam ter sido realizadas não aconteceram.
Tempo da revolução de 1930, ditadura de Getulio Vargas. O despotismo não permitia ao cidadão manifestar sua escolha pelo voto.
Em 1934, sobre pressão Vargas teve que aceitar que uma nova Constituição fosse promulgada.  
Na emancipação de Farroupilha (1934), ainda persistia o regime de exceção e sem eleição, o primeiro prefeito de Farroupilha não é escolhido pelo voto livre e universal de seus munícipes. Armando Antonello, primeiro prefeito, foi nomeado.
Em 1935, realizam-se as eleições. O então prefeito nomeado Armando Antonello se candidata e pelo voto dos farroupilhenses o primeiro prefeito eleito.
Esse período democrático durou pouco. Em 1937 o retorno do regime autoritário com a outorga da Constituição que instituiu o Estado Novo, liberdade e direitos extinguidos. Antonello legitimamente eleito, desapossado.
O poder arbitrário mais uma vez retirou o estado de direito, fim de eleições, o retorno ao sistema de nomeação dos governantes.
Em Farroupilha, exonerado Armando Antonello, nomeado para o cargo o capitão Eudoro Lucas de Oliveira. A sequência dos nomeados: tenente Januário Dutra; Nelson Thooy Schneider; Antonio Pedroso Pinto; Raul Cauduro; Alberto Farinon.
Em 1946, nova Constituição, estado pleno de direito, a independência dos poderes.
Eleições em Farroupilha, vencedor João Baumgartner que falece no exercício de seu mandato. Assume o vice Angelo Bartelle.
Ainda na democracia eleito em 1951 Dr. Jayme R, Rossler. Em 1955 Giacomo V. Luchese, que se exonerou do cargo, substituído pelo vice José Francischini. Em 1960 prefeito eleito João Grendene.
Eleição municipal de 1963. Para maiores informações nada encontro no TRE.
Há informações das eleições de 1959 e de 1968. Há um interregno entre aqueles anos. Eleições de 1963, nada constam.
 Na época, entre os 180 municípios do RS, somente cinco tem dados daquela eleição: Caxias do Sul, Casca, Irai, Marau e Tapejara.
Explicação existe quanto ao desleixo: a falta de preocupação com caráter público da informação isso porque os cartórios não guardavam a documentação.
A falta de das informações oficiais não era primazia do Rio Grande, aconteceu em todo o território nacional e por isso esse escamteamento havido – trata-se de outra explicação - acredita-se, por interferência do golpe militar de 1964 com a intenção dar sumiço as informações. Diante da ausência de dados oficiais se sabe que a eleição municipal de 1963 em Farroupilha ocorreu e valeu porque nos corredores do prédio da prefeitura está postada na galeria de ex-prefeitos a foto de Arno Busetti, como também na galeria da Câmara Municipal fotos dos vereadores eleitos.
                                                                 *** ***
Nessa eleição ocorreu um fato pitoresco de repercussão nacional narrado por envolvidos na ocasião. Arno Busetti, aberta as urnas, na primeira contagem, ganhou a eleição por 1 voto. O candidato Jose Francischini não aceitou o resultado, erro na contagem, alegou. Recontagem, Francischini venceu por 5 votos. Advogados de Busetti recorrem à Justiça eleitoral, alegando que as urnas depositadas no Clube do Comércio não tinham a segurança, vigilância policial necessária e por isso foram violadas e adulteradas e por isso modificação na recontagem. Recurso aceito, Arno Busetti prefeito.
   



Voto anulado não anula nada

Faço minha caminhada diária percorrendo ruas da cidade. O ideal, mais saudável, seria andar entre árvores, por alamedas. Exigir demais. Uma exigência não demais, seria que os logradouros tivessem calçadas sem aqueles buracos, frestas, vãos, verdadeiras armadilhas para uma queda, uma torção ou fratura do tornozelo.
Apesar dos percalços sigo a caminhada. Hi... quem encontro. Maroca.
Maroca como sempre elegante, em qualquer lugar. No mercado, na casa das amigas, na casa da comadre Etelvina (principalmente lá para que ela não faça qualquer comentário desairoso). Cabelos bem arrumados, com aquele irresistível charme do tom natural grisalho. O rosto com maquiagem de leve base. O vestuário simples, vestido gracioso de cores discretas. Sapato de salto baixo.
Assim passeia Maroca com sua inseparável bolsa para carregar não se sabe o quê.
É bom ressaltar que não se trata de apetrecho de “marca”, afinal Maroca é professora aposentada recebendo salário em atraso.
Lá vai ela cheia de estilo, posuda, pose com jeito de empáfia. Sempre foi assim na sua postura altiva, que fazia com que, quando lecionava, ao entrar na sala de aula, os alunos de pé a recebia e assim a reverenciava.
Cumprimento-a: “Como vai Maroca?” (ela não admite ser chamada de dona).
Antes de falar alguma coisa como resposta, dá para notar a fisionomia de jeito maroto, mistura de satisfação e malicia, o sorriso irônico.
Diga Maroca, digo eu: “Qual o motivo da satisfação”?
O semblante agora inspira maldade. Maroca solta o verbo.
- Estou sim muito satisfeita. O salafrário do Pôncio Pilatos de hoje, que condenou Dilma, o patife do Judas atual que traiu Dilma, o fariseu cabotino foi cassado. Vai ser deputado agora no quinto dos infernos. Sabe, por causa dele e tantos outros sem-vergonhas, imorais, devassos, não vou participar da canalhice política, da eleição. Vou protestar, já disse, vou anular meu voto.
- Maroca seguinte, preste atenção: anular seu voto não vai anular coisa alguma
- Por que não? Estou sabendo que se 51% dos votos forem nulos, a eleição é anulada.
- Não Maroca. Explico. Se mais da metade dos eleitores faça a opção pelo voto nulo, assim mesmo a eleição não poderá ser cancelada, será rigorosamente válida, isso porque os votos nulos são descartados na contagem final. Dessa forma ganhará o candidato que tiver o maior número de votos válidos. Então seu protesto nada vale.
Digo mais. Uma eleição só pode ser anulada mediante decisão da Justiça eleitoral tornando os votos nulos, por crime eleitoral.
- Entendi. Então vou votar em branco
- Não, não adianta Maroca, trata-se da mesma coisa, o mesmo ditame do voto nulo, ou seja, não terá nenhuma influência no resultado final da eleição. Tem mais, a abstenção também não anula coisa alguma.
- Voto de castidade, pode?
Bem, aí nada sei. Sabe Maroca, votos nulos e brancos podem proporcionar uma situação inusitada. Exemplo: numa eleição, no universo de 5 mil votos, descartando 4.990 votos nulos e brancos, o candidato que tiver mais votos entre os 10 válidos, será eleito.
Digo tchau à Maroca e ela ainda irritadíssima, cuspindo maribondos, diz:
- Nisso tudo, votos nulos, brancos, de castidade, tenho uma certeza: tem um patife que durante muitos anos não vai ganhar voto algum.