Banco na
praça. Ali sentadas estão duas senhoras, ambas sexagenárias, assim são idosas, talvez
mais ofensivamente velhas, ou de forma mais amena “a melhor idade”, de maneira aliviante
“a terceira idade”.
Eufrásia e
Clotilde, assim chamadas as duas senhora, numa tarde de sol brilhante primaveril,
estão protegidas pela sombra de um imponente e exuberante ipê, desabrochando
flores de tom amarelo vivo, lindamente douradas.
Eufrásia e
Clotilde, tranquilas desfrutam a natureza. Jogam conversa fora, normalmente
falando de quem está doente ou de alguma novela da Globo.
A
conversação num relance é interrompida.
Uma linda
moça, também com a proteção do frondoso ipê, caminha com aquela manifestação
alegre de um sorriso nos lábios. O andar com jeito malemolente, mexendo com os
quadris, sem saracoteio exagerado, cheia de graça, passa em frente duas
conversadeiras. Diz Eufrásia para Clotilde: - “Olha só, olha o vestido daquela moça.
Que sem-vergonhice, saia curtinha”.
Clotilde
concorda: - “É demais, é uma indecência. Reparou o decote, quase lá no umbigo.
Depois reclama de que é estuprada”.
As duas mais
uma vez concordam. Estão em comum acordo quanto ao fato trata-se de uma provocação
com aquela vestimenta, sujeita e culpada por um possível estupro.
*** ***
A jovem nada
ouve e se ouvisse em nada influenciaria em seu comportamento.
Lulu é assim
conhecida. Linda, exuberante, segue soberana, divina rainha.
Adiante encontra
a amiga Lili. Lulu além da saia curta, do decote, usa blusa de um ombro só, que
permite denotar a bela parte lateral, a perfeita proporção harmônica da região
escapular. Lili de supetão, surpreendida,
logo depois dos famosos três beijinhos como cumprimentos:- “Que roupa ousada
Lulu. Não tem medo de ser estuprada?”
Lulu fica
indignada e convincente solta o verbo
como resposta:- “Eu quero liberdade total, até mesmo no meu jeito de vestir.
Não vou me censurar, me apavorar, ficar tolhida em minhas vontades por causa de
machismo, dos tarados”.
Lili, com
roupagem bem discreta, sem mostrar seus belos atributos físicos, diz:
- “Queria
ter sua coragem Lulu, mas tenho muito medo de ser estuprada”
*** ***
Pesquisa
encomendada à Datafolha pelo Forum Brasileiro de Segurança Pública, apura que um, em cada três brasileiros, acham que a
mulher tem culpa pelo estupro, por provocação pelo uso de roupas ousadas.
Entre homens
e mulheres um terço afirma que mulheres que usam roupas indecorosas é um desafio,
tentação ao animalis macho. Essas mulheres provocativas não podem reclamar de
uma possível violência, de uma estupração.
30% das
pessoas entrevistadas possuem aquela opinião, sendo 42% dos homens e o mais incrível
e desalentador 32% das mulheres, a maioria com mais de 60 anos, tipicamente de
forma radical conservadoras, como Eufrásia e Clotilde.
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