quinta-feira, 1 de maio de 2014

O Segredo dos seus olhos

Não esperava. Deveras foi inesperado, mas uma agradável surpresa.
Noite dessas, mais exatamente, numa noite de sexta-feira, com o controle na mão, busco na televisão por mais de 100 canais - assim informa a publicidade das empresas prestadoras desse tipo de serviço, eu duvido - um programa ao meu gosto.
Passo pelos chamados canais abertos e a cabo. O que não esperava, o que foi inesperado, é que um canal aberto de grande audiência como o da Rede Globo, habitual exibidor de filmes típicos de ações de enredos absurdos, característicos de aventuras com roteiros surreais, de corridas desvairadas e colisões de carros, de explosões mirabolantes,  das comédias americanas de imbecil besteirol e mais, de forma inusitada, exibir um filme numa sexta-feira, o que não é comum na grade de programação da emissora.
 Pois bem. O filme era aquele que durante algum tempo desejava assistir.
Na época, no circuito comercial sua exibição durou pouco, não era um filme adequado ao sucesso de bilheteria. Explica-se: pela trama elaborada, diferentemente de filmes populares, e por ser um filme argentino.
Poderia alugá-lo numa locadora, mas não foi fácil encontrá-lo. Então a Rede Globo, por aquilo que não era esperado, me proporcionou a oportunidade de assistir o atraente, inolvidável e excelente O Segredo dos seus olhos, filme argentino que conquistou o Oscar de melhor filme estrangeiro em 2010.
O filme é excelso, sublime, enternecedor e provocativo.
Mexe com os sentimentos humanos, com a inquietude das pessoas, revela mesquinhez, sórdidas atitudes.  
 Parte do roteiro focaliza os anos de chumbo da ditadura militar argentina (época 1974), de dúbias decisões do poder jurídico, das propositais e interessadas falhas nas investigações policiais, de um crime a ser desvendado, mas conta também a estória fantasiosa de um romance não correspondido, de amor platônico, de personagem sofrido com a solidão.
Um filme atraente, interessante, desde as primeiras cenas e que tem  um final surpreendente, tanto no castigo do assassino, como de um amor nada conclusivo.
Benjamim Espósito, protagonista principal é um aposentado com o cargo de oficial de justiça de um Tribunal Penal. Por isso tem a oportunidade, tempo suficiente para escrever um livro a partir de sua experiência como investigador de um homicídio.
Conta uma história trágica, um crime, um estupro seguido de um assassinato, de uma bela jovem. Nessa parte do filme há cenas dantescas, fortes e sanguinolentas.
Esse crime é refeito pelo diretor do filme usando o flashback, interrompendo a sequência narrativa para revelar como ocorreu o crime.
Na investigação Espósito tem ajuda do amigo Pablo e de sua superiora no tribunal Irene. Essa é outra parte do filme romântica, sublime, enternecedora.
Espósito nutre um amor recolhido a chefe Irene. Não se revela, fica indefinido, guarda segredo.
Tem receio em verificar que suas expectativas, que suas fantasias não serão correspondidas. Espósito, pela diferença social, pelo posicionamento superior profissional de Irene, sua amada, o inibe em revelar-se, em declarar seu amor.  
Entre o crime ocorrido, enredo de sua história para seu livro a ser escrito, passam-se 25 anos (por isso o uso do flasback).
Anos de solidão, de um amor não revelado. Sente amargura de uma existência inexpressiva, um ex-dedicado burocrata em busca de sua realização como escritor.
Essa profunda sensação de esquecido, de abandono é traduzida em duas ocasiões, em duas falas por parte de Espósito, quando revela toda sua desilusão pelo isolamento, o desengano de um amor nunca conquistado. Diz: “Uma vida vazia, cheia do nada”




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