Durante muitos anos em jornal do Rio de Janeiro, Nelson Rodrigues, dramaturgo, escritor e filósofo das coisas da vida, era autor de uma coluna intitulada A vida como ela é, que retratava por suas crônicas diárias, de maneira peculiar, os dramas, as tragédias do cotidiano, o outro lado da vida sofrida, as amarguras e infortúnios das pessoas, as paixões angustiantes com suas traições amorosas de fins trágicos, os desalentos de famílias envoltas e perdidas pelo vicio e outras deformidades, amarguradas e resignadas, enfim vidas desgraçadas como elas são.
Numa antiga peça teatral de Luiz Iglesias o texto se baseia nos anseios, embaraços, nos problemas de uma família. São três os núcleos da tragicomédia de Iglesias compostos de jovens, pessoas de meia-idade e idosos. Em determinado momento da peça há diálogos em que a ênfase é os jovens se mostrarem ansiosos para chegarem à idade adulta. Um personagem mais experiente filosoficamente coloca sua reflexão diante da aflição dos jovens, diz ele:
- Quando se pergunta horas ao jovem ele responde de modo descontraído, são 10 horas e caqueradas, a pessoa de meia-idade diz 10 horas e 10 minutos, ao idoso a resposta será, 10 horas, 10 minutos e 20 segundos.
Assim é marcado o tempo de vida, por dias, meses, anos, formado por um conjunto de horas somadas, a principio demoradas, depois contadas de modo indiferente e por fim marcadas vagarosamente para que o tempo nunca passe, não sejam tão rápidas.
Em certa ocasião, perguntado qual o conselho que daria aos jovens, o mesmo Nelson Rodrigues respondeu: “envelheçam”.
Um amigo encontra outro casualmente depois de algum tempo: “está ficando velho”. O outro: “sim é um fato, mas tem gente que não consegue”.
Muitos jovens por irresponsabilidade, por seus próprios erros, pelos vícios malditos, não conseguem envelhecer, morrem prematuramente pelos desalentos, amarguras e infortúnios, a vida sofrida, para eles como a vida é, infelizmente.
Tempos atrás tive o primeiro contato. Foi através de uma resenha de um crítico musical. Elogiava a moça comparando sua voz grave e maravilhosa à voz de estrelas como Sarah Vaughan do jazzz e Macy Gray do soul.
Meu gosto musical inclui a tradicional música americana como o jazz, soul e blues. Pelo relato do crítico interessei-me em saber quem era a jovem. Por isso procurei descobri-la, ouvi-la. Encantei-me como milhões de pessoas pelo talento, por aquele timbre grave magnífico de voz. Descobri seu nome: Amy Winehouse.. Descobri mais. Acreditei trata-se de uma negra, daquele tipo característico de cantores de música típica do sul dos Estados Unidos. Engano. Tratava-se de uma jovem inglesa de aparência franzina, de jeito delicado e terno, de forma tênue, de cor lívida e que cantava maravilhosamente bem. Infelizmente aquela voz prematuramente se calou, aquela pessoa precocemente desapareceu. Talento desperdiçado, uma vida perdida aos 27 anos, uma promessa de possível eterno sucesso que sucumbiu, morreu sem ter o seu carisma acontecer.
Amy escolheu seu lado de vida. Embrenhou-se no vicio. Não teve saída.
A vida desastrada que ela escolheu, vida como foi por sua vontade e seus erros, vida como ela é para Amy e muitos jovens.
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