quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Quando fui jovem e o jovem de hoje

Faz tempo, muito tempo faz quando fui jovem. Jovem em um tempo muito distante, longínquo mesmo da espetacular inovação e modernidade que o jovem de hoje tem, como a internet e o telefone celular.
Jovem no período remoto quando o sucesso musical internacional eram os Beatles e cenário nacional dominado pela Bossa Nova e as composições de Gil e Caetano, estilos muito afastados do atual modernismo da música sertaneja, do funk e do rap.
Jovem num Rio de Janeiro de paisagens deslumbrantes, belíssimo como hoje ainda é. Um jovem carioca que depois de adulto seguiu o caminho traçado por influência familiar, chegando à outra paragem, para ficar junto ao aconchego dos pais gaúchos, que no Rio também viveram.
Nasci na sofisticada, atraente e famosa Zona Sul, bairro do Botafogo, imagem colorida e seleta dos turistas, mas a minha ligação com a região termina aí. Minha vida de jovem foi vivida além dos túneis, adiante do centro da cidade, do Maracanã, limites máximos de requintados habitantes do Leblon, Ipanema, Copacabana e adjacências e dos turistas. Morei além desses locais, na Zona Norte primeiro no bairro Piedade e depois muito mais além, em Anchieta.
Jovem carioca, apreciador de belas praias, de areia branca, mar azul, outras não iguais assim, sujas e poluídas, mas sempre, em qualquer ocasião desfrutando junto ao mar, livre e solto, a envolvente natureza.
Morador suburbano tinha como opção a praia de Ramos, já na época não muito agradável pela marginalização, fazendo parte hoje do complexo de favelas da Maré e pela poluição. Alternativas então, a praia do Galeão, embaixo da ponte, na Baía da Guanabara, em direção ao aeroporto e as praias da Freguesia ou Bananal na Ilha do Governador. Quando havia disposição para encarar num domingo muito quente um ônibus lotado e percorrer uma distância mais longa, o caminho era a Barra da Tijuca, às vezes se aventurar até o Recreio dos Bandeirantes.
Jovem de outrora, de outros tempos, na formação da personalidade que não foi talvez, tão desigual ou variada quanto ao jovem de hoje, ou será que é. Hoje há o Black Blocs.
Jovem das praias, do Maracanã, da incúria, do desleixo, de chutar a vida de modo fútil  como dar um pontapé em algum objeto na calçada, sem motivo, de esgueira, mas feliz da vida, com tudo que é bom, sem remorso, sem tirania, liberto totalmente, vivendo a vida como se o amanhã não existisse.
Época do jovem, simplesmente por ser jovem, desajustado, errado, de pensamento contrário as regras, descompassado com a ordem natural das coisas, mas assim mesmo autoconfiante convencido de que está unicamente acertado, contra todos, contra tudo, num compasso diferente à razão, ao razoável, ao decididamente exato, ao verdadeiro. Tempo do jovem alienado que tenta colocar pinos redondos em buracos quadrados, do jovem da indisciplina na vida, buscando caminhos desvirtuados em todas as direções, sem medo das frustrações porque nem sabe, não tem consciência do que é enganar a si mesmo. Jovem do jeito pueril, da ingenuidade quase infantil.
Predomina unicamente o fascínio pela vida, a vida vivida sem tormentos, despreocupadamente, sem compromissos, sem acreditar na inevitabilidade do destino. O passado é recente, inexpressivo. O futuro nem pensar. O presente, esse sim, para ser vivido com muita intensidade.
Vista pelos jovens a vida é um futuro importante longo; vista pelos velhos um passado muito breve. Palavras filosóficas de Schopenhauer. Deve ser assim o pensamento do jovem com o destino de logo ali adiante no tempo ser um velho.
A vida do jovem autenticamente sem mistérios, nada há para esconder. Dos amores impossíveis conquistados e dos possíveis abandonados. Os amores conseguidos pela persuasão amorosa, perdidos sem razão, sem ressentimentos, amargura ou saudade. Rápido o jovem esquece, a ingratidão desaparece.  Por um amor perdido acha-se outro.
A lógica amorosa do jovem nem sempre é frugal. É volúvel e leviana por natureza.
 O jovem de ontem que eu fui e do adulto depois, observou a passagem, o comportamento de centenas e centenas de outros jovens. Durante 30 anos, como professor, acompanhei jovens contemporâneos, estudantes da escola pública, a grande maioria de classe média baixa.  Pertencentes a esse grupo social os poucos jovens que chegaram a conclusão do ensino médio, evidentemente mais realizados, do que aqueles muitos que encerraram seus estudos no ensino fundamental. Jovens que chegam a essa etapa da educação com o ensino médio, mas que irremediavelmente, na imensa maioria param por ai. Não há condição financeira para prosseguirem. Não deslumbram o otimismo, não existe esperança, não é possível frequentar um curso superior e com isso ficam sem um desejável horizonte, um promissor futuro. Sentem-se derrotados, fracassados, angustiados, inibidos diante dos desafios impostos pelas desigualdades sociais, pelo desequilíbrio da sociedade, pela injustiça provocada por desmerecidos governos. Jovens desconfortados pelas imposições econômicas, sem entusiasmo, deslumbrados enganados, que não tem esperança de uma condição de vida econômica digna, do razoável para o melhor. Jovens brasileiros que certamente como adultos nessas condições, gerarão no futuro provavelmente os mesmos jovens brasileiros pertencentes ao mesmo estrato social.
E a vida continua. Todos os jovens que foram e aqueles que serão, aguardando ansiosos e angustiados, pelo fim das injustiças sociais.
Falei do jovem que fui e dos jovens que são. Dos jovens da vida comum, do cotidiano, da classe média e do proletariado. Não dissertei, não expôs qualquer ponto de vista sobre o jovem da classe média alta, o rico jovem. Não foi possível. Trata-se de um espécime que desconheço, não tive convivência.
  
   



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