sexta-feira, 30 de julho de 2010

O preço

Qual será o preço da corrupção? Muito ou pouco? 10 mil reais é muito, 200 reais é pouco? Na verdade, pela ética, na preservação da moral, não deveria valer nada.
Uma peça do teatro da vida pode explicar. No palco os protagonistas.
Cena 1: atropelamento numa rua da zona sul do Rio de Janeiro na madrugada, região de granfinos, classe média alta. Um skatista é atropelado por um automóvel e morre no local. O motorista causador do desastre foge. Com o veículo amassado é interceptado por policiais. Há evidências na parte frontal do carro que aconteceu algum acidente. Os policiais não desejam saber quais as causas. O que interessa é a propina, a maracutaia, enfim a corrupção. Pedem, solicitam ou intimam o motorista, para que tudo fique por isso mesmo, de que nada de anormal aconteceu e que possa seguir em frente. Tudo acertado, o “favor” vale o preço de 10 mil reais.
Cena 2: Subúrbio do Rio, zona norte, de gente miúda, classe média baixa. Numa rua do bairro Vaz Lobo, motorista dirige seu carro que está com os documentos incorretos: licenciamento irregular, o que o impede de circular. É surpreendido por policiais que o interrompe em seu curso. Evidentemente que constatam a irregularidade do veículo. Os agentes da lei informam que podem resolver a questão. Pedem, solicitam ou intimam a propina. O “favor” vale o preço de 200 reais. O motorista infrator informa que o seu dinheiro é de 30 reais. Um dos representantes da lei diz que é uma micharia. Nada feito.
Cena 3: Na zona sul acontece o encontro de corruptores e corrompidos horas depois do acidente. Há informação de que o negócio “sujou”. A vítima é um rapaz filho de uma celebridade global. A imprensa divulga com estardalhaço o triste evento. Situação ruim para corruptores que perderam um negócio escuso e para os corruptores, na forma passiva, na tentativa de esconder o caso, na esperança de que nada de mal aconteceria, se defrontam com uma amarga realidade. Tudo fora descoberto
Cena final: a imprensa insiste por dias no noticiário, já de forma sensacionalista no caso do rapaz atropelado. Certamente por efeito de maciça divulgação, policiais infratores são detidos em seus quartéis. Quem desejava omitir o atropelamento será responsabilizado pelo seu ato.
Enquanto isso, lá no subúrbio a noticia é dada como uma informação rotineira do noticiário policial cotidiano. O rapaz não tem os 200 reais para encerrar o caso. É convidado a embarcar na viatura policial. Recusa-se, tem medo. Medo da polícia. Em determinado momento consegue se desvencilhar da perseguição. Dirige-se a delegacia policial onde deseja registrar a ocorrência por corrupção. Não se sabe nada mais o que ocorreu. Nada mais foi noticiado.
Qual a diferença entre 9.800 reais (obvio entre 10 mil e 200 reais) pela corrupção. Trata-se das diferenças sociais, entre ricos e pobres, das celebridades e dos rostos perdidos no meio da multidão. A única certeza é de que a corrupção age em qualquer esfera social. A diferença é somente o preço.

Nenhum comentário:

Postar um comentário